Contratações Públicas e Compliance: reflexões sobre o Decreto nº 12.304/2024

Publicado em 9 de dezembro de 2024, o Decreto nº 12.304 regulamenta o art. 25 da Lei nº 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos), estabelecendo critérios objetivos para a avaliação dos programas de integridade no âmbito das contratações públicas. Com entrada em vigor em 7 de fevereiro de 2025, a norma busca consolidar parâmetros técnicos que incentivem a adoção de práticas de integridade pelas empresas que contratam com o poder público.

Embora editado pela União, o Decreto possui aplicabilidade ampla. A própria Lei nº 14.133/21 atribui competência à União para regulamentar os critérios de avaliação de integridade, o que o qualifica como norma de referência também para estados e municípios que adotaram a nova legislação.

Hipóteses de exigência do programa de integridade

O programa de integridade torna-se exigível em quatro situações:

  • Contratos administrativos de grande vulto (acima de R$ 239 milhões);
  • Aditivos contratuais que ultrapassem esse valor;
  • Processos de reabilitação de licitantes ou contratados sancionados;
  • Empates entre propostas, como critério de desempate.

Nos contratos firmados por consórcios, todas as empresas consorciadas devem comprovar a implantação do programa em até seis meses após a assinatura do contrato. Em caso de aditivos, a exigência incide a partir da assinatura do novo instrumento contratual.

Estrutura mínima dos programas de integridade

O Decreto define o programa de integridade como um conjunto de mecanismos e procedimentos internos voltados à prevenção, detecção e remediação de irregularidades. Entre os elementos essenciais estão:

  • Auditoria interna e controles contábeis;
  • Canais de denúncia e proteção ao denunciante;
  • Código de ética e conduta;
  • Treinamentos regulares de integridade;
  • Avaliação e mitigação de riscos;
  • Medidas disciplinares e planos de remediação;
  • Monitoramento contínuo.

O normativo replica os 15 parâmetros de avaliação já constantes do Decreto nº 11.129/2022 (Decreto Anticorrupção), acrescendo um 16º critério: a inclusão de mecanismos voltados à proteção dos direitos humanos, trabalhistas e ambientais — alinhamento que insere de forma mais explícita os princípios ESG no contexto das contratações públicas.

Papel da CGU na avaliação dos programas

À Controladoria-Geral da União (CGU) compete a condução da avaliação técnica dos programas de integridade, com atribuições que incluem:

  • Análise e emissão de relatório avaliativo com validade de 24 meses;
  • Comunicação dos resultados às unidades de gestão contratual dos órgãos;
  • Proposição de planos de conformidade, quando necessário;
  • Reconhecimento de certificações emitidas por programas como o Pró-Ética;
  • Dispensa da avaliação em casos específicos ou de validação de análises realizadas por outros entes públicos.

Nos casos em que a avaliação indicar insuficiências, poderá ser proposto um plano de conformidade, com medidas e prazos de implementação definidos.

Infrações e responsabilização

O Decreto também prevê hipóteses de infração administrativa, sujeitas à responsabilização, tais como:

  • Omissão ou atraso injustificado na entrega de documentos;
  • Recusa em prestar informações solicitadas;
  • Descumprimento de planos de conformidade propostos pela CGU;
  • Declarações falsas relacionadas à existência de programas de integridade.

Caso as condutas também configurem atos lesivos nos termos da Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), o processo será unificado, conduzido na forma do processo administrativo de responsabilização (PAR).

As sanções administrativas aplicáveis incluem:

  • Advertência;
  • Multa de 1% a 5% sobre o valor do contrato ou da licitação;
  • Declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração pública.

Considerações finais

O Decreto nº 12.304/2024 insere-se no esforço institucional de fortalecer a integridade nas contratações públicas, estabelecendo critérios uniformes e exigências proporcionais ao porte e risco das contratações. Ao mesmo tempo em que define obrigações, o normativo reconhece a diversidade das estruturas empresariais, admitindo a adaptação dos programas à realidade de cada organização.

Esse movimento reflete uma transição do modelo puramente punitivo para um modelo de integridade orientado por incentivos, transparência e prevenção. Empresas que pretendem se manter competitivas no setor público precisarão não apenas formalizar estruturas de compliance, mas comprovar sua efetividade com base em critérios objetivos e auditáveis.

A consolidação desse paradigma poderá representar um marco para a profissionalização das contratações públicas, em sintonia com padrões internacionais de governança e conformidade regulatória.

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